sexta-feira, 6 de julho de 2012

Desafio Literário: A Mulher que Escreveu a Bíblia


Sinopse: Ajudada por um ex-historiador qeu se converteu em 'terapeuta de vidas passadas', uma mulher descobre que, no século X a.C., foi uma das setecentas esposas do rei Salomão - a mais feia de todas, mas a única capaz de ler e escrever. Encantado com essa habilidade inusitada, o soberano a encarrega de escrever a história da humanidade - e, em particular, a do povo judeu - a tarefa a que uma junta de escribas se dedica há anos sem sucesso. Com uma linguagem que transita entre a elevada dicção bíblica e o mais baixo calão, a anônima redatora conta sua trajetória, desde o tempo em que não passava de uma personagem anônima, filha de um chefe tribal obscuro.


Livro: A Mulher que Escreveu a Bíblia
Autor: Moacyr Scliar
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 216

Prêmio Jabuti. Quando soube o tema do Desafio Literário de julho fiquei até feliz, pois seria uma forma de me forçar a ler alguma coisa escrita no Brasil. Não é que eu seja preconceituosa com a literatura nacional, é puro costume de ler coisas de fora. Ler é um vício, mas o gênero da leitura também. E é difícil sair da zona de conforto, por isso essas chacoalhadas de vez em quando são boas. Expandem os horizontes.

Mesmo assim eu fui me desesperando à medida que o mês se aproximava, porque não conseguia decidir qual livro escolher. Olhava as sinopses e poucas me agradavam e as que eu gostava estavam além do que meu bolso permitia no momento.
Optei por A Mulher que Escreveu a Bíblia por pura comodidade. Imprimi a lista de ganhadores do prêmio Jabuti nos últimos anos, fiz a carteirinha na biblioteca municipal, olhei rapidamente entre os volumes disponíveis e os que achei mais à mão foram Desenganos e A Mulher que Escreveu a Bíblia. Não pensei duas vezes: levei os benditos para casa.

Comecei pelo livro do Moacyr Scliar (que faleceu em 2011, segundo fui informada pelo rapaz da biblioteca),  e não me arrependi, porque alguns dias depois li alguns capítulos do outro título e não me empolguei, seria uma leitura cansativa e forçada. A Mulher pode não ser perfeito, mas pelo menos a leitura é agradável e flui com muita naturalidade.

Achei a ideia do livro bem original. Eu já li a Bíblia algumas vezes e nunca contestei (e continuo não contestando) a sua autoria, por isso não me passaria pela cabeça a ideia de escrever uma história onde outro é o autor. Aliás, a autora. E feia, ainda por cima. E a personagem é divertidíssima, cheia de sentimentos revolucionários característicos de uma pessoa que pensa e não aceita tudo que tentam fazê-la comprar. Uma mulher bem à frente do seu tempo. Diga-se de passagem, mesmo hoje a feia estaria por aqui desestabilizando padrões e quebrando tabus.

O que me desagradou um pouco foram os excessos. A personagem era uma mulher inteligente e que escrevia com perfeição, a ponto de Salomão encomendar a redação da Bíblia para ela, e mesmo assim todo o tempo a garota pensava em sexo. Seu pensamento era desbocado, livre e sexual, e a intensidade com que o autor insistia no tema acabou me cansando. Excelente nas primeiras 50 páginas, mais do mesmo nas outras 150. Tanto que as partes do livro que mais me agradaram foram as que saíram da mesmice, como, por exemplo, a história da concumbina Mikol.

O final também me deixou um pouco decepcionada. Era esperado, mas nem por isso menos desestimulante. Eu não me importaria se tivesse um pouco mais de comprometimento, mesmo sendo esta uma história de ficção com altos tons de deboche. 

No entanto, dou vivas ao autor por não nomear seus personagens. Com exceção do próprio Salomão, apenas a concumbina Mikol e a Rainha de Sabá são nomeados, o que permite que o autor utilize de personagens sem dor na consciência, afinal, em uma corte tão próspera quanto a de Salomão, onde existiram 700 esposas e 300 concumbinas para o rei, era de se esperar que houvesse de fato alguns pastores, líderes de tribos, mulheres mais e menos vivazes no harém, copistas, escribas, aduladores...um sem número de personagens prontos para serem utilizados e não contestados, afinal, ninguém é identificado.

Sinto-me grata por ter encontrado A Mulher na biblioteca. O livro pode ter seus pecados, mas não posso negar que o autor entregou um texto bem amarrado, divertido e revolucionário. Nem tanto pela heresia no tocante à autoria da Bíblia (e algumas ideias propagadas pelos pensamentos da personagem, em especial o pouco respeito com Deus e as tradições do seu povo, o que, admito, no meu caso particular me incomodou), mas principalmente no lugar da mulher no mundo e a necessidade de ser reavaliado esse conceito atual que prima pelo excelência exterior, quando há tanto encerrado no intelecto humano e principalmente no caráter do indivíduo que merecem um lugar melhor na escala de importância que damos aqueles que nos cercam.

"A feiura é fundamental, ao menos para o entendimento desta história. É feia, esta que vos fala. Muito feia. Feia contida ou feia furiosa, feia envergonhada ou feia assumida, feia modesta ou feia orgulhosa, feia triste ou feia alegre, feia frustrada ou feia satisfeita - feia, sempre feia".


2 comentários:

Stael Brunow disse...

Olá, acompanhe seu blog. Estou querendo a indicação de um bom romance. Obrigada - Stael

Vivi disse...

A narrativa visa a desconstrução do texto bíblico para recriá-la sob uma perspectiva irônica. Essa leitura foi o tempo todo um confronto entre e olhar da personagem e o meu, uma ve que vejo o texto bíblico, escrito no original,(haja vista que as traduções têm muitas inserções clandestinas) com reverência. Bjs!

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